‘preTABU’: ABU preta é tabu?

Por André Guimarães* e Pedro Grabois**

É tabu ainda hoje falar de raça, cor, etnia, negritude, racismo, preconceito, discriminação racial no Brasil? E na ABU, é tabu falar de racismo?

A primeira pergunta que vem: afinal, o que é “raça”?

Quando falamos da população negra no Brasil e no mundo e das possibilidades de se combater o racismo onde quer que ele se apresente, não estamos tratando de um conceito biológico. Já se sabe que as diferenças genéticas entre os diferentes grupos étnicos são mínimas.
Quando se fala de combater o racismo, seja através de políticas de ação afirmativa, seja através de outras políticas, o termo “raça” ganha um sentido social e político. Ninguém é enquadrado como negro, indígena ou branco na sociedade por ter determinadas características em seu DNA que a tornam pertencente a uma raça ou outra. As pessoas, quando se veem em alguma situação de discriminação racial, sofrem preconceito por trazerem, em seu corpo e em sua pele, determinados traços que remetem a um segmento social historicamente inferiorizado por outro.

ABU: um movimento universitário. Como combater o racismo na universidade e na sociedade?

Muitos acreditam que a discriminação no Brasil seja apenas social e não mais racial. Por acreditarem nisso negam-se a ver os males que o racismo causa ainda hoje. Acreditamos que a ABU, que já se posicionou em outros momentos, deve continuar fazendo-o sempre, nunca deixando de pautar a luta contra o racismo como uma luta de todos!

Três episódios nos ajudam a entender a recente caminhada do nosso movimento acerca deste assunto. Um deles é um testemunho de Ilzani Santos sobre o que aconteceu em seu Instituto de Preparação de Líderes (IPL), leia aqui. Os outros dois, fazemos referência a seguir:

Se retomarmos o cenário do congresso missionário estudantil da ABUB “Missão 2006”, veremos que as discussões acerca do papel da universidade brasileira e também acerca do racismo já estavam presentes. O curta-metragem “Juventude e Universidade”, produzido para o Missão 2006, lançava a pergunta “Qual o papel da universidade?” e discutia o papel do estudante inserido na universidade, constatando o quanto que o problema inclusão/exclusão social está associado à discussão desses papéis e deixando ainda a pergunta “Qual o papel da ABU nisso tudo?” Ainda durante o congresso, um comentário racista da parte de um dos congressistas ocasionou, entre outras reações, uma interessante reflexão (feita por Alexandre Brasil Fonseca e Ricardo Wesley Borges, secretário geral da ABUB na época) no Boletim Informativo Respondendo ao Chamado (RAC) de março/abril daquele ano. Eles afirmam, em determinado momento:

“A evasão da universidade e a dificuldade dos mais carentes é uma realidade e a mesma tem sido combatida por vários mecanismos. Com a política de cotas estas questões continuarão no centro das atenções e certamente merecerão maior atenção da Universidade […] As principais ações precisam se dar no sentido de oferecer condições para a permanência destes alunos, mais por necessidades econômicas do que por deficiências na formação.” 1

Mais recentemente, no Congresso Nacional (CN) da ABUB em julho de 2010 – o “CN da década”, isto é, o momento de diagnóstico da caminhada do movimento na década anterior e de prognóstico para a caminhada na próxima década –, a palestra de Alexandre Brasil Fonseca acerca dos desafios da universidade brasileira trouxe uma importante provocação, que tomamos aqui como uma diretriz para a reflexão nos próximos anos na ABUB:

“O Brasil é um país extremamente racista! A realidade discriminatória e excludente no Brasil precisa nos tocar. O que se fala sobre o Reuni, o Prouni, as cotas na ABU? Qual a posição da ABU? O que a ABU pensa sobre transporte estudantil, sobre o financiamento estudantil? Nós somos um movimento estudantil!” 2.

O que pensamos sobre esses temas? Vamos usar os recursos que temos nas mãos pra conversar sobre racismo e política de cotas na ABU? A ABU é cada um de nós que nos reunimos em nossos grupos de estudo bíblico nas universidades. Por que não fazer EBIs temáticos? A Bíblia precisa ser nosso ponto de encontro também pra enfrentar o racismo!

ABU: um movimento bíblico. Como combater o racismo através da leitura da Bíblia?

Não acreditamos que o caminho seja procurar justificar e/ou localizar na Bíblia a defesa de uma determinada posição de política pública em favor da população negra do país. Embora consideremos a proposta de uma “postura negra diante da leitura da bíblia”(3) de grande contribuição para uma reflexão séria sobre racismo no meio evangélico, entendemos que a ABUB vai continuar optando por uma leitura bíblica que embasa, em termos de princípios mais gerais, as ações de justiça em defesa daqueles que são colocados à margem por sistemas sociais, políticos, econômicos e culturais opressores. Optar por uma abordagem bíblica mais geral sobre todas as situações de injustiça não deve impedir a ABUB de pensar e ter uma agenda que inclua a especificidade da população negra. Dito isto, uma enormidade de textos bíblicos se abre para nós, citamos aqui apenas um exemplo:

“Não é este o jejum que escolhi: Que soltes as ligaduras da impiedade, que desfaças as ataduras do jugo, e que deixes livres os quebrantados, e despedaces todo jugo? Não é também que repartas o teu pão com o faminto, e recolhas em casa os pobres desterrados? E, vendo o nu, o cubras, e não te escondas do teu próximo?” Isaías 58:6 a 8

preTABU: uma agenda para a Aliança Bíblica Universitária do Brasil!

Muitos na sociedade pensam que falar em raça já é racismo, já é dividir a sociedade em duas cores. Mas isso é puro tabu, que precisa ser vencido! Vamos conversar sobre o tema, dialogar com humildade e amor, falar e fazer algo contra a discriminação e a desigualdade racial no Brasil, que deixa milhões de jovens negros e negras sem emprego, sem acesso a universidades e escolas técnicas, sem acesso a saúde e que mata 3 vezes mais jovens negros do que brancos.

“Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo…” (Efésios 4:15)

Referências

(1)FONSECA, A. B.; BORGES, R. W. Não era pra ser assim…: uma reflexão sobre racismo e cotas. In: Respondendo ao Chamado, março/abril 2006 – n.1, p. 4 e 5 – https://www.abub.org.br/recursos/2011/11/nao-era-para-ser-assim-uma-reflexao-sobre-racismo-e-cotas
(2) https://www.abub.org.br/compartilhe/noticias/desafios-da-universidade-brasileira
(3) Pr. Marco Davi de Oliveira fala sobre o assunto neste artigo: http://www.novosdialogos.com/artigo.asp?id=401

*André Guimarães é estudante de História na UERJ, caminha com a ABU desde 2009 e atua no Movimento Negro há alguns anos.
**Pedro Grabois é mestrando em Filosofia na UERJ e representa, junto com Márcia Aguilar, a ABUB no Conselho Nacional de Juventude.

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