*por Thaysa Farias
“O amor que nos faz um
O amor é o que nos faz um
O amor se revela a mim
Como uma bandeira, verdade e graça
Um mandamento, e a nossa canção.”
(Palavrantiga)
Uma das coisas que mais destacamos quando falamos sobre a ABUB é o grande mistério da comunhão, onde pessoas de todos os cantos do país e varias tradições evangélicas, conseguem desfrutar neste espaço de um tempo ímpar. Alguns até já denominaram nossos encontros como um ensaio do porvir, pois nos parecem com o imaginário do que seja o céu! Romantismo à parte, realmente essa sensação nos toma, e entendemos que tudo isso é apenas o reflexo do amor que nos faz um, ou seja, Jesus Cristo, o filho de Deus, agindo em nosso meio.
No entanto, quando descemos a montanha – voltamos dos nossos Cursos Férias, Congressos Nacionais, IPLs, etc – e temos que viver nosso cotidiano, também acontece outra coisa muito interessante: nossos olhos passam a enxergar um monte de “coisinhas” em nosso amigo abuense, que de fato começam a nos incomodar, criando uma nuvem negra e pesada, onde antes existiam risos e confiança mútua. Neste caso, sempre temos inúmeras e boas justificativas para esse sentimento, e queremos logo propor uma mudança urgente para nosso colega, pois se ele assim continuar, estará destoando da áurea que rege o nosso grupo. Mas é aí que geralmente chegamos numa encruzilhada, pois as diferenças que revelam nossa diversidade e expõem alguns conflitos, são difíceis de serem sintetizadas. Há infinitos fatores – sociais, religiosos, políticos, econômicos, etc – que contribuem para que um sujeito pense e aja de modo distinto dum outro, e esses pontos serão como filtros multicoloridos que se ajustam nas lentes que nos fazem contemplar e viver o evangelho.
Com certeza nos meus primeiros anos de Grupo Local na ABU São Luis/MA vivi isso e foi de grande aprendizagem para mim. Em nosso núcleo, tive amigos que seguiram uma caminhada com Cristo bem diferente da que eu experimentei. Tínhamos gente de Comunidades Cristãs não institucionalizadas; outros que passaram pelas nuances evangélicas ditas: neopentecostal, pentecostal e tradicional; e, ainda, aqueles que vinham do espaço que cultivava o lendário costume de não poder jogar futebol – sim, isso existe! (risos). Neste caso, é possível perceber a diversidade do grupo, né? E de fato surgiram muitas disputas entre nós. Algumas costumeiras e “bobas” – como a clássica “eleição versus livre arbítrio” – outras mais sensíveis, que precisaram do exercício do perdão para serem superadas e que, com a Graça de Deus, permitiu o cultivo de amizades gratificantes. De fato, muitos dos meus preconceitos só foram vencidos a partir do momento em que eu me permiti compartilhar uma amizade sincera com essas pessoas, e ver nelas coisas para além da aparência. Digo mais: tudo isso só aconteceu quando nos propusemos a materializar em nosso dia a dia a prática do amor.
A famosa frase atribuída a Santo Agostinho, “No essencial, unidade; Nas diferenças, liberdade; em todas as coisas, o amor”, resume bem isso. Temos as Bases de Fé da ABUB que sinalizam para a essência e unidade; também temos nossa infinita diversidade, que deve ser preservada a partir da liberdade ofertada a todos e indistintamente. E se há algum desequilíbrio nessa balança, deve ser regulada pelo amor.
Bom, sei que o exercício do amor muitas vezes não é fácil, mas é possível (Mt 5: 48), sendo esse o grande mandamento do nosso Deus: ame ao Senhor de todo o seu coração, alma e mente; também, ao seu próximo como a você mesmo (Lc 10: 25-37), e este é o modo como podemos agradá-Lo (Hb 13:1). E na Parábola do Bom Samaritano Jesus fala quem é o nosso próximo: é todo aquele que eu tenha a oportunidade de servi-lo (Lucas 10: 25-37).
O apóstolo Paulo dirá que somos um só corpo, com o mesmo Espírito e esperança. Temos um Senhor, uma fé e um batismo; e nosso único Deus é pai e Senhor de todos. E é Cristo, e não nós, quem faz o corpo ficar ajustado com as partes ligadas entre si por meio da união de todas elas, funcionando e crescendo por meio do amor. (Ef 4: 6 – 16). Aqui fica claro que não é algo que vem de nós, mas passa por cada um de nós. Também em 1 João (4:21) temos: nosso amor não deve ser somente de palavras e de conversas. Deve ser um amor verdadeiro, que se mostra por meio de ações. O é certo é que quem ama a Deus, que ame também o seu irmão.
Veja que o amor em Cristo é a única oportunidade para essa relação. Por isso, lindamente Paulo, depois de dar várias orientações à Igreja em Coríntios, disse que iria ensinar um caminho melhor que todos os que ele já havia descrito (1 Cr 12: 31), ou seja, o caminho do amor, que injeta significado a todas as coisas (conhecimento, fé, dons, serviço, sacrifico), pois ele é perfeito e eterno, onde encontramos verdade, esperança e alegria (1 Cr 13).
E em outra oportunidade, segue dizendo que nós precisamos nos esforçar em alcançar esse amor (1 Cr 14:1) e buscar compreendê-lo em toda a sua largura, comprimento, altura e profundidade, mesmo que neste corpo mortal ainda seja impossível contemplar a beleza de sua perfeição (Ef 3: 17-19).
Por isso, esse compromisso com nosso próximo é revolucionário, onde nossa liberdade em Cristo jamais poderá ser apontada como motivo para continuarmos fazendo as coisas da nossa velha natureza, mas ao contrário, para que o amor faça a gente servir uns aos outros (Gl 5: 13), por meio do Espírito Santo que age sobre cada um de nós, revelando o caminho que devemos seguir. (Ef 1: 17)
Agora você pode ter chegado nesse ponto da leitura e percebido que está vivendo algum desses conflitos em seu grupo. Então, vamos refletir sobre algumas coisas práticas:
Primeiro: não seja aquele que insiste para que o outro transforme qualquer coisa nele para simplesmente adequar-se às suas expectativas e “apaziguar” a relação (Gl 6: 13-15). Se existir mudança, que seja provocada pelo Espírito Santo, trazendo arrependimento daquilo que é pecado. O que está no coração do homem só poderá ser convertido quando afetado pelo amor de Cristo, e esse último só cresce onde existe liberdade. Ainda, se alguém entre vocês pensa de maneira diferente, Deus vai tornar as coisas claras para ele (Fp 3: 15-16). Em último caso, os que permanecerem no pecado serão tratados pelo próprio Deus, em seu devido tempo (Mt 13:41).
Segundo: esteja orando especificamente por cada pessoa e situação que estão te incomodando, pedindo a Deus que as barreiras sejam superadas. Muitas vezes o maior entrave está em nós mesmos. Somos orgulhosos e preferimos nos proteger sob o manto de nossas verdades. Lembre-se, o amor é ação, não um sentimento, por isso, tenha iniciativa de ir ao encontro do seu irmão. O apóstolo Tiago disse: tenham paciência, confessem os seus pecados e façam oração uns pelos outros para que vocês sejam curados (5: 8 – 16), sendo o amor que ocasionará a cura e o perdão dos muitos pecados (1 Pd 4:8).
Terceiro: abster-se das discussões que são apenas para “marcar território” e não tem nada a ver com o plano de Deus, que é conhecido somente pela fé (1 Tm 1:5), além de ter misericórdia dos que têm dúvidas (Jd 1:22) já é um bom começo. Muitas desses “debates” não valem a pena, a não ser que a pessoa esteja realmente interessada em saber o que você pensa sobre determinadas questões; também, a coerência das palavras do apóstolo Paulo na carta aos Romanos (cap 14 e 15) cabe aqui. Não devemos julgar nosso irmão na fé ou mesmo ter qualquer atitude que o faça cair, mas nos obrigar a agradar a todos, para a glória de Deus, assim como Cristo aceita a cada um de nós com nossas imperfeições (2 Pd 1:9). Fato é que, respeitar e aceitar as diferenças dos nossos (1 Cr 10:23) é fundamental para minimizar as dificuldades de um movimento interdenominacional e internacional como a ABUB/IFES.
Quarto: para você que é líder, digo: tenha mais paciência consigo. Ser referência em qualquer espaço é sim uma grande responsabilidade, mas não deve resultar em peso e culpa por não ser exatamente como seu grupo deseja, pois na caminhada cristã o servir deve ser realizado com alegria e liberdade, para a glória de Deus. (2 Cor 9:7). O apóstolo Pedro disse que cada um deve usar o seu próprio dom para o bem do outro (1 Pd 4:10), mas se a bagagem está pesada, alguma coisa deve ser revista, pois Nosso Senhor nos prometeu um fardo leve. (Mt 11:28-30)
Creio que Cristo nos convida para relações profundas, sensíveis e corajosas, então, troquemos as pedras do caminho pelo AMOR, que une perfeitamente todas as coisas (Cl 3:14), e juntos com o Anjo (Ap: 19:9), nos alegremos, pois fomos convidados para a maravilhosa festa de casamento do Cordeiro!
*Thaysa Farias, formada em Serviço Social pela UFMA, atualmente está cursando Letras na UFAM.
