Por Ana Elizabete Machado – Conselheira da ABUB no Conjuve.
“Procurem o bem-estar da cidade para a qual fiz que os levassem em exílio e orem a ADONAI a favor dela; pois o bem-estar de vocês está ligado ao bem-estar dela. […] Pois sei quais planos tenho em minha mente para vocês’, diz ADONAI, ‘planos de bem-estar e não de coisas ruins; de modo que possam ter esperança e futuro”Jr. 29. 7 e 11
No mês de julho tivemos em todas as nossas regiões os cursos de férias com o tema: Pranto, Denúncia e Esperança – estudos em Jeremias. Certamente as muitas histórias vividas e contadas nestes sete encontros pelo país deixarão marcas inesquecíveis naqueles que participaram destes momentos. Pra mim, uma das grandes marcas foi o próprio Jeremias, conhecê-lo melhor na leitura de Eugene Peterson (no livro Ânimo!, resenha prévia para o CF) e aprofundar a compreensão da realidade vivida por ele nos estudos e exposições bíblicas. Ao ouvir Jeremias que em toda a sua vida, incansavelmente (incansável não no sentido de não sentir dor ou sofrimento por todos os males que via e vivia, mas por não desistir, mesmo em meio a toda a dor) lutou para ver o povo de Israel voltando-se para Deus, vivendo uma vida justa (Jr. 21. 11-12 e Jr. 22.16).
Foi criado em mim, ou continua sendo criado, um desejo (e, este desejo, creio, vem do Espírito de Deus), de viver e lutar por uma vida justa, e esta luta é uma luta permanente, para a vida toda! No nosso CF tivemos o grande privilégio de ouvir a história de vida da Iracides Quixabeira (obreira da região Centro-Oeste nas décadas de 70 e 80), era como se o próprio Jeremias estivesse conosco dizendo: “a vida inteira Deus esteve comigo, continuem, há muito o que fazer!” Isto me trouxe tamanha esperança, e é este o centro da mensagem do profeta: que o Senhor tem pensamentos de paz sobre nós! (Jr. 29. 11-14). É algo que me faz repensar minha visão a cerca de Deus e toda a nossa prática, porque afinal Ele nos pede que “procuremos o bem-estar e oremos” pela cidade onde estamos (Jr. 29.7).
Não, este não é um texto sobre o CF, apesar do começo dele. Este é um texto sobre o Estatuto da Juventude, mas para que pudéssemos juntos, enquanto ABUB, entendermos este tempo no nosso país, resolvi falar do que boa parte de nós, abuenses, viveu neste último julho e que certamente saímos transformados pela vida e palavras do “profeta chorão”, para que entendamos, juntos, a importância da participação (ou não) deste processo.
No dia 05 de agosto a presidenta da República sancionou o Estatuto da Juventude, marco legal que direciona como devem ser as políticas públicas de juventude em todo o nosso país. A ABUB participou do processo de construção deste estatuto, junto a muitas outras organizações de juventude do Brasil, nas gestões em que esteve no CONJUVE (Conselho Nacional de Juventude), com os seguintes abuenses: Patrick Timmer (ABU Campinas), Sarah Nigri (ABU Vitória), Tais Amaro (ABU Floripa), Morgana Boostel (ABU Vitória), Marcia Aguilar (ABP São Paulo), Pedro Grabois (ABU Rio) e Karen Aquino (ABU Juiz de Fora). Entretanto a discussão não esteve apenas neste patamar nacional do Conselho. Tivemos a oportunidade de ter conferências livres de juventudes nos CF’s 2011, em que pudemos ter a participação de mais ou menos 300 abuenses.
Neste momento, algumas questões não podem deixar de ser repetidas.
Podemos relembrar o que foi dito pela conselheira Karen Aquino:
“Às vezes não conseguimos visualizar como essas discussões intermináveis e difusas sobre políticas públicas podem mudar algo. Ainda mais quando falamos de jovens, que como eu, tem a oportunidade de cursar uma faculdade, tem aquilo que necessita para sobreviver sem dificuldades extremas. Estando nesta condição, é difícil enxergar como isso tudo pode contribuir para mudar a vida de alguém, até porque a maioria dos programas sociais atingem uma parcela da população que está longe de ter as oportunidades que temos. Quando aquilo que se discute “lá em cima” é concretizado (ou deixa de ser) em políticas e programas, estes jovens, que mais sofrem com a desigualdade social, com a má distribuição de renda do nosso país, são os mais afetados.”
E outra questão trazida a nós pelo conselheiro Pedro Gabrois:
“Alguns anos se passaram, e eu permanecia acreditando nas pequenas mudanças, nas pequenas transformações que o Evangelho (em forma de alimento espiritual e físico) podia causar na vida das pessoas. No entanto, uma inquietação sempre me acompanhou: eu me via agindo sempre sobre efeitos da violência e da injustiça, tentando remediar micro-problemas, enquanto as estruturas da sociedade permaneciam não questionadas e inquestionáveis. Uma convicção passou a me acompanhar: era preciso, de alguma forma, articular as pequenas ações por justiça na vida das pessoas à minha volta com ações que incidissem sobre “o todo” da sociedade na qual eu vivia. Quem me ajudou nesse processo de pensar e agir para além da “realidade local” foi a ABU.”
Sabemos que muitos ainda não entendem a participação da ABUB no CONJUVE, mas creio que estas falas da Karen, do Pedro e de Jeremias respondem a estes que procuram uma resposta sincera. Jeremias clamou ao povo israelita para que andasse em justiça, fizesse justiça àquele que é oprimido. No Brasil termos, enfim, uma lei que determina direitos e possibilidades de autonomia para a parcela da população que mais sofre com violência e desigualdade, resultantes da injustiça, é também uma resposta a este chamado profético. Não há porque não estarmos neste espaço.
O estatuto vem aprovado com grandes ganhos para a juventude brasileira, principalmente, aquela juventude que mais tem sofrido com a injustiça em nosso país, como a Karen nos alerta. Vem também com alguns problemas, como a diminuição de direitos a favor de ganhos financeiros de grandes grupos culturais e estudantis. Mas vem mais com muita esperança, com muita coisa a ser feita para o bem daqueles que por décadas têm sido oprimidos em nosso país.
O estatuto é resultado de nove anos de debates entre o governo e sociedade civil, Secretaria Nacional de Juventude e Conselho Nacional de Juventude, Câmara Federal e Senado. Certamente a pressão popular nas ruas, no último junho, apressou a sanção do estatuto, entretanto, não se pode pensar que foi algo feito “na correria”, já havia muita gente trabalhando por mudanças sociais para a juventude do nosso país, e algumas delas podemos dizer que somos nós, e sabemos que não só nestes espaços.
Os princípios do estatuto são: “promoção da autonomia e emancipação dos jovens; valorização e promoção da participação social e política, de forma direta e por meio de suas representações; promoção da criatividade e da participação no desenvolvimento do País; reconhecimento do jovem como sujeito de direitos universais, geracionais e singulares; promoção do bem-estar, da experimentação e do desenvolvimento integral do jovem; respeito à identidade e à diversidade individual e coletiva da juventude; promoção da vida segura, da cultura da paz, da solidariedade e da não discriminação; e valorização do diálogo e convívio do jovem com as demais gerações.”
O estatuto prevê muitas possibilidades para o desenvolvimento integral do ser humano em idade jovem, dentre eles estão previstos apoios governamentais em iniciativas culturais, esportivas, ambientais, educacionais e a criação de conselhos de juventude em nível estadual, distrital e municipal, aí estão mais espaços para continuar agindo em favor da justiça!
O convite é: participe! Participe da luta de Jeremias, pranteando pela juventude que ainda é oprimida em nosso país, denunciando o mal que gera esta opressão, e anunciando esperança com nossas ações e palavras!