Naquele momento eu entendi o pecado, e foi através da arte

por Tom De Craene*

originalmente publicado no blog da IFES (versão em espanhol)

Sou um evangélico de quarta geração. Meus pais me ensinaram a amar a Jesus e a sua Palavra. Fui à Escola Dominical e a dezenas de acampamentos e encontros cristãos. Mas alguns conceitos, algumas doutrinas e algumas verdades tornaram-se completamente reais para mim quando me aproximava dos trinta (anos). Posso pensar concretamente em duas ocasiões nas quais isto aconteceu e as duas foram uma experiência artística.

A primeira foi no Ichtus Bélgica (movimento estudantil no país), quando pedi aos estudantes que refletissem, através da arte, sobre o conceito da história da salvação. Quando estavam expostas todas as obras, a arte me pegou desprevenido: fiquei fisicamente enjoado duas vezes. Uma vez foi quando um roteiro de filme apresentou a imagem de folhas podres para expressar a degradação que o pecado traz. A segunda vez foi quando fomos apresentados a um mundo perfeito, feito a partir de elementos naturais, como folhas e galhos, que representam a boa criação, que o grupo land-art tinha enegrecido com fogo. Essas exposições, juntamente com uma apresentação de música clássica e pinturas da criação, queda, redenção e consumação, teve um impacto profundo em mim.

De repente, eu pude compreender o fato de que o pecado era muito mais do que “quebrar as regras” ou “ficar de fora dos planos de Deus para você”. Embora as descrições sejam boas, nunca havia me ajudado a ver a gravidade do pecado e como isso afetou a Deus. Muito menos, essas definições me fizeram ver o quão depravado era. Então, eu percebi que o pecado também tinha uma dimensão estética: o bom é corrompido, o belo torna-se feio.

A segunda verdade doutrinal se tornou real para mim na Polônia, durante a Assembleia Mundial da IFES, em julho de 2011. Eu estava criando um Departamento de Arte no qual os participantes podiam ver boa arte e orar, refletir e descansar diante de Deus. Uma dessas peças foi chamada de “Agnus Dei”: explorava a frase muitas vezes cantada, “eis o Cordeiro de Deus que tira os nossos pecados”. O artista, Willem Zijlstra, tomou um cordeiro de verdade, amarrou suas pernas, o matou e um taxidermista (semelhante a empalhador) o recheou novamente (veja imagem ao lado). Em seguida, colocou o cordeiro sobre uma pilha de jornais que representavam tanto os pecados do mundo, como o altar.

Montei a exibição à noite antes de todos os participantes chegarem. A montagem da pilha de jornais do altar foi difícil fisicamente (estrutura), mas emocionalmente eu estava “bem”. Mas, quando eu tirei o cordeiro para fora da caixa a fim de colocá-lo sobre a pilha, lutei e senti sobrecarregado. Fiquei profundamente emocionado com esse acontecimento: “Isso realmente aconteceu por mim, isso realmente aconteceu por nós“.

Estas são apenas duas histórias pessoais, mas eu conheço muitas outras pessoas que tiveram experiências semelhantes: apreender verdades, adorar pela primeira vez, encontrar-se com Deus, ser apontado para o amor de Jesus, ser confrontado com o sofrimento humano – tudo isso acontece por meio das artes.

E não deveria nos surpreender. Uma de nossas verdades centrais é a encarnação, Deus tornando-se homem, Deus tomando forma e vida como parte da história. Sendo assim, o como (forma) e a história são importante, porque esta é a forma que Deus escolheu para salvar.

Então, por que eu fui repreendido porque “apenas contei uma história, em vez de dar uma palestra” quando apresentei a história da salvação para cerca de 60 estudantes recentemente, usando nada mais do que drama e pinturas? E por que algumas das palestras que temos em conferências da IFES são tão pesadas em conteúdo (o que eu amo, não me interpretem mal), mas tão leves quando se trata de envolver a nossa imaginação, tão leves no estilo e não usam todos os nossos sentidos? Por que quando estudamos a Bíblia usando dramatização, ou quando retratamos a história com o barro, ou comparamos o texto com a música atual ou escrevemos nosso próprio Salmo… por que é que isto ainda visto por muitos como um prelúdio apenas, um aperitivo antes das “coisas realmente importantes”?

Será que estamos levando a encarnação como um modelo a sério? Onde estão as artes, o uso da imaginação, criatividade e história em seu ministério estudantil e em sua vida espiritual?

 

* Tom De Craene é Secretário Geral da Ichtus Bélgica, serviu o movimento na Flandres por cerca de 10 anos. Parte da sua vocação é criar espaço para a arte e os artistas.

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Leia também: Se a luz do mundo – Que mundo nós refletimos através da arte?

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